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#belarecatadadolar – reflexos de uma cultura da docilidade


Foto de Chiquinha Gonzaga a mulher brasileira, mestiça, que revolucionou a musica brasileira

Foto de Chiquinha Gonzaga, mulher afro-descendente que

revolucionou a música brasileira



Porque hoje acordei faminta!


Uma mulher bela, do lar e recatada sempre tem ao lado um homem, macho, bom pai de família, temente a Deus e que faz os acordos mais obscenos às escondidas, com a desculpa de que cabe a ele lidar com o trabalho sujo.


Para mim falar de política ou tentar ver de que modo a política pode avançar está totalmente relacionado a análise do comportamento e da natureza humana, mais especificamente a uma análise das emoções.


Qual a relação entre a campanha da #belarecatadadolar e nosso quadro político?


Ha três pontos interessantes na #, a primeira, que vem sendo nos últimos anos amplamente discutida sobre padrões de beleza, que sabemos se reduz a mulher branca, magra e feliz[1]. Assim, abordarei os dois outros aspectos: recatada e do lar. O que esses dois aspectos (apontados como qualidades) guardam e como não estão diretamente relacionados a apenas um modelo de mulher, mas de homem e de cultura.


Talvez fique mais claro para nos mulheres o que implica ser recatada, pois aprendemos desde cedo que não é bonito uma mulher brigar, ter raiva, falar mais alto do que os outros. É primordial que sejamos discretas e nunca chamemos muito a atenção, seja exibindo nossas curvas ou nossa voz.


Por sorte não fui criada por um pai machista e somente tive que lidar com isso fora de casa, e talvez esse contraste tenha possibilitado mais clareza sobre o problema, mas com certeza também gerou muita raiva.


Esse é o ponto fundamental que quero mergulhar. Não é somente a mulher, mas historicamente somos conhecidos por sermos “bons selvagens”. E compramos muito bem essa ideia de docilidade, gentileza e aceitação. E o pior, não é nossa herança ameríndia, mas nossa herança católica-jesuítica quem nos brindou com esse engodo. Nossa herança ameríndia é antropofágica e ela não guarda nenhum traço de docilidade, ela não é dual e dicotômica, ao contrário ela devora tudo.


Estamos cansados e principalmente doentes e deprimidos. O fascismo é reflexo da exigência de um comportamento linear, regrado e perfeito e a depressão, que nos medica cada dia mais, na verdade é a raiva reprimida.


O estudo das emoções nos ensina que agredimos e ficamos violentos quando, na verdade, estamos sentindo medo ou tristeza, mas raramente raiva. Medo e tristeza é o primeiro sintoma e podemos dizer que o golpe de 64 foi extremamente violento e agressivo para coibir a mesma agressão e violência que sentíamos. Não sabíamos que era raiva, colocávamos nosso corpo na linha de combate. E desse período seguiu-se toda uma ditadura, que vivemos até hoje e ainda não superamos: a normalização dos corpos, o tal biopoder. A consequência disso foi e está sendo uma forte depressão.


Para você ter uma ideia da importância da compreensão do papel das emoções em nosso comportamento, sabe-se hoje, por exemplo, que 85% dos casos de depressão, a emoção que mais atua na manutenção desse problema é a emoção de raiva e não a tristeza, como erroneamente é divulgado.


Contudo, talvez a própria medicalização esteja ajudando a libertar os corpos e algumas vozes estejam não mais apenas gritando mas criando corpos poderosos, corpos extrovertidos, extravagantes e loucos.


Sentir raiva é maravilhoso e, acima de tudo muito positivo, pois a emoção nos sinaliza que fomos transgredidos e que algo precisa ser feito. Nossa política não mudará enquanto não mudarmos, enquanto não empoderarmos as diferentes vozes e não estamos falando aqui de minorias, estamos falando de uma grande parte de nossa população que é compassiva e amorosa e esta cansada de ver esse jogo sujo.


A raiva não é somente maravilhosa por nos mostrar injustiças, mas também porque esconde a compaixão, a amorosidade que esta sendo reprimida. Assim, voltando ao modelo #belarecatadadolar, não é a docilidade que tem valor, mas o amor por todas as injustiças, a compaixão pelas diferenças e a vontade de poder ser feliz sem que seja necessário destruir qualquer um dos lados.


E para que essa catarse seja coletiva precisamos deixar nossos lares e ocupar as ruas de modo a exorcizar qualquer traço de conformidade e aceitação.


A revolução é moral e a política naturalmente vem junto. Esse é um caminho sem volta.






[1] A campanha do facebook belamente mostrou que todos os gêneros e comportamentos são belos.


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